15 outubro 2017

A Casa Centenária

Em memória do meu avô Joaquim



As memórias da casa centenária
tinham raízes antigas
que se erguiam do chão
com a demagogia das conquistas clandestinas
espinhos obtusos que cercavam a vida
entortando as ombreiras das portas
propagando-se pela estrutura como uma aleivosia fria
evadindo os seus ramos volteados
pelas frestas das janelas enjambradas
à procura de um recurso entorpecido
de uma ideia revolucionária
de uma fresta revelada obscura iluminada
que lhe desse uma senda definitiva
para exterminar a ditadura vitupeada

Havia nas conjuras secretas
uma sede atormentada de autonomia
vozes embargadas que em sussurro eclodiam
inscrições e manifestações destemidas
que desafiavam a heteronomia do Estado
ceifando com estucadas determinadas
a melancolia circunspectamente instalada promovida
pelo negrume das perseguições obsessivas
as deportações inesperadas
a castração das almas livres ensanguentadas
e o amargo fel das prisões injustiçadas

A casa centrava-se
nesse ardor de náusea ofegada
onde o ramalhar de vozes conjuradas
se concentravam em sussurradas congeminações
contra as atmosferas rarefeitas de honra e dignidade
utilizando um scriptum dialéctico cúmplice dissimulado
vermelho sangue gravado em todas as palavras
segredos e conjuras ajustados à rebelião armada
silhuetas com reflexos da “luta continua”
Deus, Pátria e a liberdade tanto ansiada
conspirações ocultas contra a vil ditadura
a “revolução” e a voz acossada da insubmissão
um solo longe dos opressores condenados
liberto de todas as considerações abstratas
do cinzento amargurado sufocado imoderado
dos espaços exteriores controlados
tendo apenas nas mãos os traços firmes da esperança
volteando a sorte madrasta a cada mudança
sonhando com o dia distante agora
em que a vitória explodirá esfuziada
readquirindo a ferro e fogo
a tão desejada procrastinada
LIBERDADE

CRV©2017

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