reparei num boneco articulado.
Era um principe mecânico que me olhava
montado na garupa de um cavalo
inerte
numa pose caótica e distante
[como todos os guerreiros que se preparam
para o salto que aglutina o branco das nuvens
e o negro das telas
onde se cruzam espadas
e o frio se entranha nas engrenagens soldadas
com a melancolia dos profetas que silenciam
todo o conhecimento das suas artes da guerra]
preparando-se para mais um conjunto de cadáveres insepultos
na sua cruzada como homem superior,
troculento e sanguíneo,
imperturbável
com todos os golpes que desfecha
esventrando, degolando e aniquilando
todos os desgraçados
que ousam utilizar metáforas
longe das suas peias.
Reparei na lança que transportava tombada
e na espada que bramia na sua cintura delgada
prestes a varrer de um só golpe
todas as figuras amestradas
posicionadas no seu imenso palco de guerra.
Olhai os vultos solitários na contenda
atirados à sorte escamoteada
pelo princípe empoleirado no cavalo
tornando o futuro dos infelizes
um redundante horizonte massacrado
afogado na fúria do defensor
de impolutas verdades extenuadas a dor.
Ao crepúsculo da tarde
dará o mote de ataque
aguardando-o um horizonte arcaico
pejado de sombras sinistras
cujos contornos longínquos relembram
um quadro repleto
de inquietantes figuras místicas.
E parte em debandada
seguro com a sua armadura dourada,
o seu elmo finamente decorado,
cumprindo no seu porte e na sua cavalgada
todas as preces dos seus adoradores teatrealizados
que sucumbem
à especulação gerada pela sua sombra projectada
deixando rastos alongados
nos caminhos por onde passa
quando a tarde já cresce obliqua
num imenso litoral disperso e diáfano.
Com um sorriso impiedoso e demorado
o seu corpo imobilizado como o mármore
levanta em glória a espada e a lança
desferindo com grande apanágio
veementes golpes sádicos
[naquele minuto cénico
que o torna tão masculamente belo]
sem escrúpulos e com o porte e candura dos guerreiros astutos
não importando se degola
homens, palha ou árvores
sentindo o frenesim de um D. Quixote
que se desembaraça das sombras a monte
degolando menires, dólmens ou ruinas
enfim, tudo o que possa constituir
epitáfio futuro
por realce e mérito
da sua galopante mestria
apesar de rodeado de defuntos.
Pelo caminho
não deixará de se divertir com ninharias
cortando a cabeça a algum pobre
ou zombando com as suspirantes donzelas
cavalgando por dentro de capoeiras
para grande espanto
De regresso ao seu castelo,
vem o anafado príncipe cheio de sua glória
trotando só com a sua vaidade em memória
devolvendo ao ar
um frémito, uma aura, um desprezo directo
a todos os que se atrevem
[mesmo os enlouquecidos pela grandeza do porte]
a dar vénias, arrufos de vitória
funcionando as multidões à sua passagem
como uma verdadeira força caótica
deflagrando palmas, tocando tambores,
criando fogueiras nos cantos e proferindo gritos de clamor
"Lá vem o nosso principe" dizem uns
"Que esplendorosa figura" dizem outras
todos se olhando mutuamente
debruçados sobre aquela afinidade indirecta
unidos num fenómeno psicológico
presos num artifício que gera contaminações da alma
obscura o espírito,
gerando logo ali uma lenda
que ecoará para a eternidade
construida sob as verdades inabaláveis
que eclodiram nos campos de batalha
divinizando a partir dali
o maravilhoso principe sonhado,
com inúmeros projectos feitos à sua preciosa imagem
perpetuando-o em estátuas, telas e altares de devoção beatificado
edificados com cores vibrantes, imaculadas
compondo com graça e arte
o lado plácido inqualificável
apenas atribuído aos grandes estetas de guerra.
Reparei na lança que transportava tombada
e na espada que bramia na sua cintura delgada
prestes a varrer de um só golpe
todas as figuras amestradas
posicionadas no seu imenso palco de guerra.
Olhai os vultos solitários na contenda
atirados à sorte escamoteada
pelo princípe empoleirado no cavalo
tornando o futuro dos infelizes
um redundante horizonte massacrado
afogado na fúria do defensor
de impolutas verdades extenuadas a dor.
Ao crepúsculo da tarde
dará o mote de ataque
aguardando-o um horizonte arcaico
pejado de sombras sinistras
cujos contornos longínquos relembram
um quadro repleto
de inquietantes figuras místicas.
E parte em debandada
seguro com a sua armadura dourada,
o seu elmo finamente decorado,
cumprindo no seu porte e na sua cavalgada
todas as preces dos seus adoradores teatrealizados
que sucumbem
à especulação gerada pela sua sombra projectada
deixando rastos alongados
nos caminhos por onde passa
quando a tarde já cresce obliqua
num imenso litoral disperso e diáfano.
Com um sorriso impiedoso e demorado
o seu corpo imobilizado como o mármore
levanta em glória a espada e a lança
desferindo com grande apanágio
veementes golpes sádicos
[naquele minuto cénico
que o torna tão masculamente belo]
sem escrúpulos e com o porte e candura dos guerreiros astutos
não importando se degola
homens, palha ou árvores
sentindo o frenesim de um D. Quixote
que se desembaraça das sombras a monte
degolando menires, dólmens ou ruinas
enfim, tudo o que possa constituir
epitáfio futuro
por realce e mérito
da sua galopante mestria
apesar de rodeado de defuntos.
Pelo caminho
não deixará de se divertir com ninharias
cortando a cabeça a algum pobre
ou zombando com as suspirantes donzelas
cavalgando por dentro de capoeiras
para grande espanto
da criação de galos emproados e galinhas histéricas
atordoando os pacatos animais domésticos
alvoraçando tudo à sua passagem
os cães que ladram asfixiados, os gatos que miam assustados,
os cavalos que se empinam desenfreados
o gado sereno que se espanta desaustinado,
por todo o lado ecoam tambores à sua passagem
como se um relâmpago cruzasse o movimento no ar
e o vento trouxesse orações que jorram das mãos dos crentes
todos se curvando com o seu aspecto altivo e distante
nunca se rendendo aos olhares diletantes
de quem se aventura a saudá-lo rente.
alvoraçando tudo à sua passagem
os cães que ladram asfixiados, os gatos que miam assustados,
os cavalos que se empinam desenfreados
o gado sereno que se espanta desaustinado,
por todo o lado ecoam tambores à sua passagem
como se um relâmpago cruzasse o movimento no ar
e o vento trouxesse orações que jorram das mãos dos crentes
todos se curvando com o seu aspecto altivo e distante
nunca se rendendo aos olhares diletantes
de quem se aventura a saudá-lo rente.
De regresso ao seu castelo,
vem o anafado príncipe cheio de sua glória
trotando só com a sua vaidade em memória
devolvendo ao ar
um frémito, uma aura, um desprezo directo
a todos os que se atrevem
[mesmo os enlouquecidos pela grandeza do porte]
a dar vénias, arrufos de vitória
funcionando as multidões à sua passagem
como uma verdadeira força caótica
deflagrando palmas, tocando tambores,
criando fogueiras nos cantos e proferindo gritos de clamor
"Lá vem o nosso principe" dizem uns
"Que esplendorosa figura" dizem outras
todos se olhando mutuamente
debruçados sobre aquela afinidade indirecta
unidos num fenómeno psicológico
presos num artifício que gera contaminações da alma
obscura o espírito,
gerando logo ali uma lenda
que ecoará para a eternidade
construida sob as verdades inabaláveis
que eclodiram nos campos de batalha
divinizando a partir dali
o maravilhoso principe sonhado,
com inúmeros projectos feitos à sua preciosa imagem
perpetuando-o em estátuas, telas e altares de devoção beatificado
edificados com cores vibrantes, imaculadas
compondo com graça e arte
o lado plácido inqualificável
apenas atribuído aos grandes estetas de guerra.
CRV©2013
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